Como Bolsonaro aliou o nacionalismo à sua estratégia de campanha
A poucos dias da eleição presidencial, o Brasil vive outro cenário de intenso embate entre candidatos que, em questões ideológicas, chega a superar as tensões vivenciadas pelo período eleitoral de 2018. Atualmente, Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Messias Bolsonaro disputam a vaga da presidência da república, um duelo que, pelas estatísticas, está acirrado.
Das análises feitas por oito institutos de pesquisa, sete indicam vitória para o candidato Lula, mas sem considerável distância. Apenas a realizada pelo ModalMais/Futura traz Bolsonaro afrente do oponente, contendo 50,5% ante 49,5% dos votos válidos. Todos os estudos foram feitos entre 18 e 21 de outubro.
Dentre as estratégias de campanha realizadas por ambos os candidatos, aquela que mais chama a atenção é a adotada por Bolsonaro. Se apoiando na mesma tática desde sua entrada na corrida presidencial, em 2018, o candidato paulista usou da bandeira e dos símbolos nacionais como fortalecimento de sua base política e de apoiadores.
De acordo com o cientista político Augusto de Oliveira, professor de ciência política, relações internacionais e ciências sociais da PUC-SP, o que a gente tem hoje e que causa estranheza é a substituição dos símbolos partidários, que denotam a pluralidade e a diversidade de ideias presentes na sociedade, por parte da candidatura do Bolsonaro, pela própria bandeira nacional.
Para ele, isso causa uma politização dos símbolos nacionais que não seria conveniente ao considerar que eles não representam apenas um partido político ou apenas um candidato, mas, sim, a pluralidade das opções politicas e ideológicas presentes no Brasil. Além disso, esses atributos constituem, também, a possibilidade da criação de acordos e consensos em torno da diversidade social, política e ideológica que nós temos no país. “Quando existe a apropriação política dos símbolos nacionais como se partidários fossem, esses ícones acabam perdendo sua dimensão nacional e genérica, o que não é conveniente”, avalia.
Ainda assim, por se tratar de um objeto de uso comum de todos os brasileiros, não existem regras legais quanto ao uso da bandeira. Contudo, Oliveira vê em tal apropriação uma circunstância estranha decorrente da expectativa, por parte da candidatura de Bolsonaro, de manipular esses símbolos nacionais com o intuito de propagandear a imagem de que ele seria a única alternativa convergente ao interesse nacional.
Esse cenário ao qual Bolsonaro se apoiou nos idos de 2018 se refere especialmente à realidade de que o brasileiro vive uma espécie de orfandade de representatividade política, algo que teve seu início a partir do segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff.
Naquele período, o brasileiro vivenciou as questões relacionadas à Lava Jato, à crise econômica, à crise institucional e, também, o impeachment. Esses fatores fizeram aumentar a desconfiança do eleitor com relação ao sistema político.
No movimento de recuperar esse sentimento em âmbito nacional é que surge o embate entre Lula e Bolsonaro. Uma vez que o Brasil é um país sem partidos fortes e que a noção de representatividade depende da identidade pessoal do candidato, a remoção da nova candidatura do ex-presidente Luiz Inácio em 2018, na visão do professor da PUC-SP, causou um efeito político em que as pessoas ficaram sem a capacidade de identificar qual o candidato que despertava seu interesse tanto para o bem quanto para o mal.
Bolsonaro, por sua vez, realizou tomadas de decisão prejudiciais ao desenvolvimento de uma comunidade calcada no senso de igualdade e liberdade de expressão, o que pode ser tratado como um prejuízo à autonomia no processo de representação política. “Na medida em que a representação não é esclarecida, mas decorre, por exemplo, de visões falsas sobre a realidade, fake news e preconceitos, a gente tem de fato um prejuízo ou uma fraude à representação política que diminui a potência da democracia no Brasil”, aponta Oliveira.
Todo e qualquer novo período eleitoral é um momento em que a esperança da retomada dessa representatividade política seja reascendida em cada um dos brasileiros. Além dos comícios, participações em telejornais, podcasts e programas de televisão, os candidatos se aliam, também, aos materiais impressos como folhetos, panfletos, santinhos e outros objetos que o eleitor possa levar consigo.
Apesar de ser uma estratégia muito utilizada por diversos candidatos, independente de sua legenda, essa atitude representa perigo ao ambiente por evidenciar a falta de educação ambiental do brasileiro. Somente no dia de votação do primeiro turno, a prefeitura de Taubaté, município do interior de São Paulo, recolheu 7,7 toneladas de lixo eleitoral das ruas.
Em Belo Horizonte, no mesmo período, foram recolhidas 90 toneladas de descartes eleitorais ilegais. Para a bióloga Suzeli Almeida, consultora ambiental, ao considerar que os partidos são autorizados a iniciar a propaganda eleitoral dois meses antes das eleições, há que se avaliar que a produção de lixo eleitoral acontece durante todo esse período de campanhas e não apenas no domingo, dia de votação. “É necessário, portanto, o fortalecimento das ações e práticas educativas voltadas à sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais, com a participação e parceria de escolas, universidades, empresas e órgãos públicos”, defende.
Uma solução para barrar a produção ambiental, segundo a vice-procuradora geral eleitoral Sandra Cureau, é incentivar o eleitor a votar somente nos candidatos que não poluem o meio ambiente. Aliado a isso, Suzeli defende outros tipos de iniciativas.
A realização de propagandas através de redes sociais e anúncios online, bem como a ação dos candidatos em conscientizar todos panfletadores, os instruindo a entregar apenas um papel por residência e não despejá-los em vias públicas, auxiliam na diminuição do uso de papel e na prevenção de enchentes e alagamentos.
Com relação aos partidos políticos, a bióloga sugere a criação de pontos de coleta de resíduos nos comitês eleitorais de forma a contribuir, por exemplo, com a logística reversa para cartuchos, toners e destinação adequada de lixo eletrônico. Além disso, eles podem incluir critérios sustentáveis na aquisição de bens e serviços durante a campanha eleitoral, como a substituição de papel branco simples por papel reciclado. “Acredito que, com a conscientização de todos os eleitores e candidatos, é possível fazer com que os próximos períodos eleitorais sejam cada vez mais atrelados ao desenvolvimento sustentável e formação de valores, atitudes e comportamentos ambientalmente corretos”, reflete.
Mesmo com esses ideais de iniciativas para bloquear a poluição eleitoral, esse comportamento de desleixo ambiental por parte dos candidatos e eleitores, em união ao fato de que Bolsonaro, um candidato que se vendeu por uma postura intolerante e autoritária, venceu as eleições presidenciais de 2018 e angariou grande volume de votos na disputa eleitoral deste ano, levanta importantes questionamentos sobre a essência do brasileiro.
A cordialidade do brasileiro, imagem disseminada no exterior, não se refere a calor humano e tolerância, mas, sim, a um tipo de comportamento não-institucionalizado. Na opinião do cientista político Augusto de Oliveira, é por isso que permanece aberto na sociedade nacional, mesmo entre pessoas que, por uma razão ou outra, optaram por votar no Bolsonaro, a potência de um convívio social acolhedor, tolerante, preocupado com o ser humano e em dar respostas concretas e viáveis.
Segundo ele, o Brasil está vivendo um momento difícil, porque existem sinais de que um possível ou eventual segundo mandato do Bolsonaro agiria no sentido de manter e ampliar o bloqueio à busca de alternativas vivenciada por uma considerável parcela da população. “É uma questão que, de fato, é acompanhada com preocupação”, alerta.